sexta-feira, 26 de julho de 2013

Ainda sobre a inclusão e o recenseamento eleitoral


Já em Dezembro passado falávamos da premente necessidade de uma remodelação governamental, por razões óbvias, e que nada tinha a ver com a pressão internacional, que ainda nem se fazia sentir com tanta frequência nessa matéria. Nessa altura, nem a CPLP, e nem a União Europeia se lembraram de incluir nas suas agendas a exigência de uma alegada inclusão do partido que defendiam, porque ele já lá estava, faltando apenas engrossar o Governo de transição com mais elementos a serem designados pela direção oficial dessa formação política.

O que nós defendíamos, em nosso entender, obedecia à dinâmica de uma qualquer equipa governamental, que ao fim de um certo tempo, por razões políticas e, ou técnicas, deixou de dar as devidas respostas, neste ou naquele sector, e que por consequência, urge corrigir. Na realidade, no nosso caso, alguns sectores acusaram algum desgaste, e a linha orientadora, apesar das dificuldades de entendimento, leia-se de agenda, inerentes a este tipo de governo, tinha o dever de fechar o ciclo, emitindo sinais fortes de mudança. E acabou por fazê-lo, mau grado alguns amargos de boca, internos e externos.

Acresce-se às razões invocadas a necessidade de promover uma política realista em concertação com os demais parceiros da cooperação internacional para que o alinhamento de teses sobre a dimensão das requeridas mudanças se faça, em sintonia, e em moldes a permitir um maior desanuviamento nas nossas relações externas, dado o grau, em crescendo, da insuportabilidade do nosso isolamento.

A maneira como somos apreciados lá fora, dependerá do nosso comportamento e da forma como este dossier da inclusão for tratado. Independentemente, da forma como os interesses políticos se perfilam, com o piscar de olhos nas próximas eleições, era de prever, desde logo uma divergência de fundo, entre os principais atores, sobre a metodologia da inclusão, que, apesar de tudo, acabou por ser implementada no processo de remodelação. 

Se para uns, o conceito da inclusão significava, tão só, o alargamento da orgânica do governo a mais umas quantas pastas ministeriais, já para outros, incluindo a comunidade internacional, a inclusão era condição sine qua non para o retorno gradual à normalidade constitucional, e consequentemente, à retoma da cooperação. Neste último caso, com uma pequena nuance, mas que é, ao mesmo tempo, um argumento de peso, ou seja, a entrada da ala oficial do PAIGC no governo remodelado.

Mal se fechou o referido capítulo, eis-nos de novo enfiados numa encruzilhada e a braços com interesses antagónicos, na questão da introdução da biometria no processo de recenseamento eleitoral. Para aqueles cuja memória é seletiva, relembramos que foi das primeiras exigências dos contestatários das últimas eleições, por isso esteve sempre na ordem do dia, de tal modo, que o próprio parlamento guineense o inscreveu e adotou em alternativa ao recenseamento manual.

Porém, a dura realidade da vida, acabou por nos mostrar que o caminho a percorrer não deve ser esse, pelo menos, para já, dado que se põe a questão dos elevados custos de tamanho empreendimento. Sibilinamente, a comunidade internacional foi-nos dizendo duas coisas: primeiro, convidou-nos a marcar uma data realista, a de 24 de Novembro, e depois, na mesma linha, mostrou-nos a sua indisponibilidade e incomportabilidade financeira em apoiar tal aventura, que a ser implementada, ultrapassaria a data fixada. Em suma, e numa linguagem mais terra a terra, a comunidade internacional quis dizer-nos, que quem não tem dinheiro, não tem vícios.

Agentes Cabo-verdianos em solo guineense

Uma insólita situação reteve a nossa atenção nos últimos dias, e passo a explicar: Quando muito recentemente, por alegadas acusações de tráfico de estupefacientes e contrabando de armas, as autoridades cabo-verdianas se precipitaram em cooperar com as autoridades norte-americanas na captura, em solo guineense, de três cidadãos nossos, entre os quais, um, com um passivo histórico de fazer inveja, porque se trata de um combatente da liberdade da Pátria e herói da luta de libertação nacional, a questão da legitimidade e da legalidade do nosso governo de transição foi posta em cima da mesa e não conseguia ser ultrapassada, porque a legitimidade do Governo de Cabo-Verde, e a sua intransigência perante a lei não podiam ser postos à prova.

Não foi o Primeiro-ministro de Cabo Verde que disse ao mundo que não negociaria com governos ilegítimos, e muito menos com governos saídos de golpes de estado? 

Mas, felizmente, Deus escreve direito por linhas tortas! 

Na realidade, tratava-se, nada mais, nada menos, de uma questão de valores inegociáveis, ou seja, o legítimo governo de Cabo-verde, agora transformado em gendarme na região oeste-africana, não podia, por razões ainda não totalmente esclarecidas, tolerar atos de banditismo na sub-região. E não havia melhor exemplo para mostrar ao mundo, do que o da Guiné-Bissau. Um país irmão. Até aqui, e por mais estranho que pareça, estamos inteiramente de acordo, embora, salvaguardemos as devidas distâncias relativamente aos procedimentos. Até porque, e à luz da hipocrisia reinante nas relações internacionais, ninguém deve subestimar o alcance da iniciativa do Governo de Cabo-Verde.

Agora, pasmem-se! Pelos tais inconfessáveis e não ruidosos canais, o Governo cabo-verdiano anda a pressionar, as autoridades guineenses a transgredir a lei para a soltura de dois agentes da Polícia Nacional de Cabo-verde, que mais uma vez despachou para a Guiné-Bissau, um país, cujas autoridades nem reconhece, para mais uma daquelas missões secretas de manter a ordem na sub-região. O incauto, mas arrogante Primeiro-ministro cabo-verdiano podia ao menos contactar as autoridades da CEDEAO, já que não chega à fala com as autoridades golpistas. A não ser que a nobre missão que lhe foi cometida, não se sabe bem por quem, de combater o grande banditismo na região, lhe tenha subida a cabeça, e já nem reconheça a própria CEDEAO. 

Mário Varela Brito e Júlio Centeio Gomes, os dois polícias, em missão e ao serviço de José Maria Neves, ao regressarem ao país de origem, depois de estadia em solo guineense, não só tentaram vender gato por lebre às nossas autoridades aeroportuárias, como ainda, e é aqui que reside o busílis da questão, tentaram fazer crer que teriam estado no nosso país para acompanhar uma alegada deportada guineense que teria cumprido pena em Cabo-Verde.

Segundo fontes bem colocadas, entre várias contradições constatadas nas declarações dos dois polícias cabo-verdianos, retivemos a que julgamos mais importante, a que reporta a existência de uma cidadã guineense expulsa. Infelizmente, da cidadã guineense alegadamente “deportada?”, nem rasto. E quando falamos de rasto, queremos exatamente dizer que ao contrário das declarações dos agentes cabo-verdianos, não só não se encontra o nome da referida cidadã expulsa no registo das fichas aeroportuárias de entrada, como ainda, após várias buscas não se localiza a cidadã em solo guineense. O que nos leva a supor o pior. Mas não vamos entrar em especulações desnecessárias. Limitamo-nos a perguntar, legitimamente, às autoridades cabo-verdianas o verdadeiro paradeiro da alegada cidadã guineense.

O Primeiro-ministro de Cabo-Verde a isso não responde, preferindo, ao seu estilo, continuar a ignorar a existência legítima e de fato do governo guineense, quando, se pronuncia na media, em termos intimidatórios, insinuando que a vinda dos agentes da polícia cabo-verdiana em território guineense seria resolvida dentro de dias e que se inscrevia numa simples missão de rotina, para acompanhar uma deportação, como se a Guiné-Bissau fosse terra de ninguém.

O Primeiro-ministro José Maria Neves, para não dar o dito por não dito, por causa das fortíssimas tiradas em que se envolveu contra a Guiné-Bissau, esqueceu-se de mencionar à media, e sobretudo, à RDP, que na última Cimeira da CEDEAO em Abuja esteve a pedinchar às autoridades “golpistas” que libertassem os dois polícias suspeitos. O Primeiro-ministro cabo-verdiano esqueceu-se de dizer que a homóloga cabo-verdiana da autoridade guineense de migração e fronteiras já emitiu um pedido de desculpas formais ao homólogo guineense. Agora só falta ao Primeiro-ministro de Cabo-Verde, e ficava-lhe bem, assumir a elegância e a humildade de pedir desculpas formais ao povo guineense por mais esta afronta, já que das autoridades guineenses nem quer ouvir falar.

É claro que não almejamos que estes dois cidadãos cabo-verdianos tenham a mesma sorte que a alegada e expulsa cidadã guineense, e muito menos, aquela, que normalmente, é reservada pela Polícia cabo-verdiana aos cidadãos guineenses expulsos de Cabo-verde, acorrentados e algemados nas prisões e nos aeroportos cabo-verdianos de regresso ao país.

Muito Obrigado

Bem-haja!

Bissau, 26 de Julho de 2013

Victor Pereira
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