sábado, 1 de outubro de 2016

Madeira dos Santos observa que os governantes têm escolhido sempre antagonismo e a falta de cooperação

''Na Guiné-Bissau dá-se mais depressa dinheiro para viagens para participação em conferências e atos internacionais do que se dá aos sectores da Saúde e de Educação, num país com recursos magros e escassos que não chegam para tudo'', Vítor Madeira dos Santos
O representante da União Europeia na Guiné-Bissau disse hoje, em entrevista exclusiva à RDP Africa que os políticos guineenses perdem tempo em "discussões bastante estéreis" em vez de promoverem o desenvolvimento do país.
Para Vítor Madeira dos Santos, um ano e meio depois da realização da mesa redonda com os parceiros de desenvolvimento, constatou-se o afundar do país em discussões que travaram os projectos de desenvolvimento.
“O que nós verificamos foi o afundar do país em discussões bastante estéreis em volta de questões de constitucionalidade, de corrupção, de legalidade, de qualidade de governação e que levaram ao afundamento de relações interinstitucionais”, disse.
Madeira invoca o facto de o Parlamento continuar paralisado há seis meses e de várias missões de mediação política internacionais e nacionais que fracassaram, até ao chamar para a resolução das questões políticas do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal Constitucional, para tentar resolver aquilo que os políticos não conseguiam resolver.
“Tenho aprendido mais sobre Direito Constitucional desde que estou em Bissau do que provavelmente quando fiz o curso de Direito Constitucional na Faculdade de Direito nos anos 70. Aqui discute-se muito, fala-se muito e aproveita-se muito todas as lacunas da legislação. Não há uma Constituição que prevê legislar sobre todas as situações que se podem confrontar numa governação democrática”, afirma Madeira dos Santos.
O português entende que o cerne do problema da Guiné-Bissau não está na Constituição da República ou no regime, e nem na articulação dos poderes, mas na forma como os titulares dos cargos públicos exercem os seus mandatos.
Madeira dos Santos observa que os governantes têm escolhido sempre o antagonismo, a falta de cooperação e de desconfiança em vez de modalidades de cooperação.
“Já conheci quatro governos e vou conhecer provavelmente o quinto, se for esse o resultado da mediação sob batuta da comunidade internacional para a formação de um governo inclusivo e de consenso”.
O delegado da União Europeia destaca também a atenção que os principais parceiros de desenvolvimento têm dado à Guiné-Bissau nos últimos tempos e acredita que é desta que o país vai resolver o problema de instabilidade crónica e focar-se nos programas de desenvolvimento.
Na longa entrevista à RDP África, Madeira dos Santos disse ainda que a União Europeia continua disponível a ajudar a Guiné-Bissau e não apenas frente política, apesar de esta ser determinante.
Afirma que os doadores não podem comprometer-se com governos instáveis, quando os governos mudam constantemente e com maus e bons ministros, e deixa claro que sem estabilidade não haverá desenvolvimento.
O diplomata português nota que na Guiné-Bissau se faz política pela política para obter ganhos políticos, tentando sempre encontrar terrenos de conflitos e de confrontações e deixando de lado as questões de desenvolvimento.
Sem receios, Madeira dos Santos afirma que no país dá-se mais depressa dinheiro para viagens para participação em conferências e atos internacionais do que se dá aos sectores da Saúde e de Educação, num país com recursos magros e escassos que não chegam para tudo.
“Não basta só prometer que vão controlar as despesas. Nós sabemos que as despesas não tituladas continuam em progressão. O que nós gostaríamos de ver é um real apertar de cinto por parte dos políticos, por parte dos gastos e de gestão corrente dos ministérios, ou seja, queremos que esse dinheiro seja revertido para o desenvolvimento rural".
Dos Santos critica também a passividade do povo guineense ao ver a classe política a estragar o país.
Rispito.com/RDP África, 30-09-2016

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