AMBIÇÃO DO 2º MANDATO AUMENTA A DESESTABILIZAÇÃO DA GUINÉ-BISSAU
As futuras eleições, com data ainda por definir, e as múltiplas estratégias em curso para recompor bases eleitorais, mergulharam a maioria das instituições democráticas da Guiné-Bissau num ambiente delicado que está a contribuir no aumento da instabilidade e divisão.
Desde os partidos, passando pela justiça e até nos quartéis, verificam-se situações anormais, com o objetivo de assegurar um segundo mandato ao Presidente, Umaro Sissoco Embaló. Essas estratégias, que elevam o risco de provocar implosões partidárias e crises sociais, têm sido urdidas pelo PR, Umaro Sissoco Embaló e os seus apoiantes, espalhados na maioria das instituições.
Os partidos políticos, com exceção da APU-PDGB, enfrentam problemas internos que têm um denominador comum: existência de um grupo que apoia o segundo mandato de Umaro Sissoco Embaló.
No PRS a situação parece ser mais grave. O grupo que apoia Umaro Sissoco Embaló (maioritariamente no Governo de Iniciativa Presidencial) tem adotado todas as tácitas para ter o controlo do partido, sobretudo depois da direção interina, vigente desde 2022, se ter distanciado do Chefe de Estado em meados de 2023.
Como forma de resistir à direção interna e contrariar as suas ações, emergiu no próprio partido um grupo de Inconformados que cedo se colou ao Presidente da República, atacando a gestão do partido e uma suposta violação dos Estatutos
O grupo começou os seus protestos com denúncias de má gestão, desrespeito dos estatutos, exigências de Congresso e, finalmente, com a criação de uma Comissão de Gestão Transitória com a missão de realizar um Congresso extraordinário, mudando a direção legalizada em 2022 pelo Conselho Nacional.
No período em que os Inconformados preparavam o Congresso extraordinário para substituir Fernando Dias na gestão interina, este reuniu a Comissão Política para sancionar os "insurgentes" internos. Sanções que depois foram aprovadas pelo Conselho Nacional que, consequentemente, marcou o Congresso extraordinário para 28 de Junho, que acabou por reconduzir Fernando Dias na gestão interina até ao Congresso ordinário, que deverá ter lugar dentro de ano e meio.
A direção interina ainda conseguiu junto do Tribunal duas vitórias contra Inconformados e a Comissão de Gestão, tendo sido questionada a legitimidade dos mesmos em intervir em nome do partido, o que não impediu que organizassem também a 29 de Junho um Congresso extraordinário no qual escolheram Felix Blutna Nandunguê para o cargo de presidente interino.
Neste momento, as duas direções se encontram em guerra depois de Supremo Tribunal de Justiça ter dado a vantagem de anotação a ala inconformada. Mantinha expectativas de parte e outra, mas agora a ala de Fernando Dias fala de manipulação da justiça e a dependência das lideranças judiciais na figura do PR. O mais certo é que PRS está mergulhado numa fragmentação profunda e se não conseguir reunir as condições para reunificar-se antes das próximas eleições vai ser fatal para o partido.
MADEM no fim da vergonha para vencer o medo
A situação no MADEM-15, partido que, em 2019, apoiou a candidatura presidencial de Umaro Sissoco Embaló, é ainda pior.
O seu líder, Braima Camará, refugiou-se em Portugal desde Março, por temer pela sua vida, e está perante contestações internas, por supostamente não apoiar o segundo mandato presidencial.
Para além dos ataques desferidos contra Braima Camará por José Carlos Macedo e Sandji Fati, presentemente há um véu divisionista dos dirigentes que têm aderido ao Projeto de Umaro Sis- soco Embaló, por compreenderem que Braima Camará não é favorável ao segundo mandato.
Todas as convulsões no MADEM estão ligadas ao segundo mandato com os apoiantes de Umaro Sissoco Embaló a acusarem a direção de querer condicionar os militantes. Para defender-se dessas acusações, a Direção tem recorrido à Abdú Mané, líder da bancada parlamentar do par- tido, e a Abel da Silva, Secretário Nacional, que tiveram como missão deslocarem-se a todas as zonas do país a fim de denunciarem os excessos do PR. Bastante frontal nas suas comunicações, Abdú Mané disse ter chegado a hora de se vencer o medo para criticar coisas que não estão bem. Tais como, a concentração e abuso do poder, manipulação das instituições, cerceamento da liberdade de expressão, mas sobretudo a violação dos princípios básicos da constituição e basilares da democracia.
Mané garantiu que sabe que, devido às suas posições, pode ser perseguido "até a morte", mas se isso acontecer que o sepultem junto da campa da mãe. Para Abdú Mané, o MADEM não pode apoiar um segundo mandato de quem não respeita os tribunais e deixa morrer na prisão, um jovem de 37 anos, numa alusão direta ao caso Papa Fanhe.
Mais crítico tem sido Abel da Silva que optou por atacar as "manobras" de Umaro Sissoco Embaló na promoção de cisões no partido através dos chamados Movimentos de Apoio. Abel da Silva garantiu que o MADEM só apoia o candidato que sair do Conselho Nacional quando as eleições forem organizadas e vincou que nenhum Movimento de Apoio será aceite.
Mas estes ataques não têm sido unilaterais. Da parte de Sissoco Embaló as posições do MADEM têm sido também alvo de ataques e o próprio PR disse, publicamente, que todo o pessoal do seu campo que o ataca, fazem-no apenas em defesa de interesses pessoais, ou por ele estar a com- bater a corrupção. Sissoco Embaló disse que ofereceu 400 milhões de Fcfa ao PRS nas últimas eleições, 500 milhões à APU e muito mais ao MADEM-G15.
"Só dei uma contribuição pessoal de 10 milhões ao PAIGC. Mas o PAIGC não me atacou durante
as eleições. Quem mais me atacou foi o pessoal do meu campo. Aqueles que ofereci dinheiro", revelou Umaro Sissoco Embaló, limitando-se apenas a precisar que "todo esse dinheiro não saiu dos cofres do Estado". Todos os partidos citados reagiram às bombásticas revelações e pediram ao PR para apresentar provas em como ofereceu tais montantes.
Entretanto, no MADEM, prosseguem ainda estratégias para os vice-Coordenadores distanciarem- se de Braima Camará.
APU imune. PAIGC estável. Quartéis vulneráveis
As estratégias do segundo mandato do PR não ficaram apenas nos partidos mais votados que, em 2019 apoiaram Umaro Sissoco Embaló.
APU, como partido, não apoiou, mas o seu Presidente, Nuno Nabian esteve envolvido na campanha e particularmente na tomada de posse simbólica de Umaro Sissoco Embaló.
Nuno Nabian assume-se agora como um opositor de Umaro Sissoco, por este alegadamente ter "sequestrado as instituições do Estado". Depois da sua Comissão Política, Nuno Nabian convidou os dirigentes do partido a saírem do Governo, o que aconteceu no espaço de três dias. APU tem confrontado publicamente o PR e o Secretário Nacional do partido, afirmando que: "brevemente vamos derrotar Umaro Sissoco Embaló".
No PAIGC a situação é aparentemente mais estável. O seu presidente, Domingos Simões Pereira, também por temer pela vida, está fora de Bissau há mais de seis meses.
Não há tumultos internos significativos, mas os dirigentes do partido que integraram o Governo já promoveram uma conferência de imprensa para qualificarem de grave, o facto do presidente do PAIGC os tratar de ex-camaradas. Para não alimentar polémicas, o PAIGC não respondeu a estas reações, acompanhadas de ameaças de denúncias, e preferiu centrar mais as suas ações no campo diplomático. Domingos Simões Pereira já conseguiu em duas ocasiões ter parlamentos internacionais a exigirem o restabelecimento da ANP guineense.
No meio de estas movimentações, os quartéis são um desequilibrado. Bom nas relações com os militares, ou melhor, com as chefias militares, Umaro Sissoco Embaló garante que já foi alvo de cinco tentativas de golpes de Estado e mais de 10 tentativas de assassinato. Mas, segundo o presidente, jamais haverá alguém capaz de atentar contra a sua integridade. Para contrariar as ame- aças, armou o Palácio Presidencial mais que qualquer outra instância militar do país. Como se não bastasse, criou unilateralmente uma força de elite que, no passado dia 29 de Junho jurou bandeira. A força Especial sob o seu comando doravante, é composto por mais de 528 homens. Pouco antes, o Estado-Maior opusera-se ao juramento que deveria ter decorrido no dia 23. Uma oposição que durou pouco, tendo o juramento realizado poucos dias depois.
A decisão de juramento de cerca de 600 homens quando existem mais de 10 mil candidatos, provocou revoltas silenciosas nos quartéis às quais a classe castrense não está indiferente. No Ministério do Interior, a situação parece mesmo ser ainda mais crítica, tendo em conta que nenhum dos paramilitares prestou juramento.
Rispito.com/e-Global, 09-07-2024
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